Infraestrutura: Trilhas
Desenho, Classificação, Traçado
Organização / Autoria: Roberto M.F. Mourão, ALBATROZ Planejamento
Desenho de Trilhas
O uso de trilhas vem aumentando nas últimas décadas, principalmente em áreas de proteção ambiental.
Na atualidade, as trilhas têm sido utilizadas como via de condução a ambientes naturais, para contemplação da natureza, prática de esportes, recreação e ecoturismo, além de ainda serem utilizadas como via de acesso e comunicação entre em áreas não urbanas.
Nesse sentido, as trilhas deixaram de ser um simples meio de deslocamento para se tornarem um novo meio de contato com a natureza. Isso se justifica pelo fato de que as trilhas possibilitam o contato com os ambientes naturais, quer estejam em áreas privadas (pousadas, hotéis-fazenda, hotéis de selva / lodges, etc.) ou públicas (unidades de conservação).
A frequência de uso das trilhas, bem como o regime de manutenção dessas e a vulnerabilidade da vegetação, são fatores determinantes da intensidade do seu impacto sobre a vegetação.
Trilhas cujo uso está concentrado em atividades de caminhada e ciclismo geralmente tendem a apresentar pouca degradação relacionada à atividade erosiva, se comparada a trilhas onde há presença constante deciclistas, cavalos ou veículos off-road.
A implantação e uso de trilhas gera modificações no seu ambiente de ocorrência e áreas adjacentes, como aumento da compactação e erosão do solo, perda de cobertura vegetal, alterações na composição, diversidade e estrutura das comunidades vegetais e, ainda, perturbações à fauna. O que vem a ser um paradoxo à conservação e restauração dos ambientes naturais.
Se por um lado representam uma ferramenta a favor da conservação e restauração por permitirem o contato com a natureza e a conscientização da necessidade de conservar, também constituem uma fonte de distúrbio a esses ambientes.
Determine seus Usuários: Uso Simples ou Uso Múltiplo
O primeiro passo no desenho de trilhas é determinar por quem a trilha será usada, qual seu interesse, quanto se usará e qual a qualidade de experiência que deseja fornecer a quem vai percorre-la.
Trilhas Uso Único
- Diferentes tipos de usuários têm diferentes tipos de tolerância ao ruído, esforço de uso da trilha (maior erosão), velocidade de movimento ou influência na trilha.
- Pode-se fornecer uma melhor experiência para um único tipo de usuário.
Trilhas Uso Múltiplo
- Podem ter muitos usuários principais e alguns secundários
- Podem ser usadas em diferentes estações ou períodos do ano por diferentes usuários
- O desenho e a manutenção devem ser planejados para todos os usuários ou a trilha terá que ser dividida em linhas paralelas
- As regras de conduta devem ser exibidas claramente por meio de sinalização (velocidade, transferência, regulamentos, etc.) quando outros tipos de usuários forem encontrados.
Trilhas para Pessoas com Necessidades Especiais
Uma prática mundial que, felizmente, cresce no Brasil, é o aumento de trilhas para pessoas com necessidades especiais.
Essa seção é ilustrativa, necessária para quem quer saber o básico e conhecer um pouco de trilhas e equipamentos para pessoas com necessidades especiais (cadeirantes, cegos, surdos, etc.).
As trilhas são adaptadas quanto ao pavimento que pode ser terra batida, solo-cimento ou passarelas em madeira onde se pode trafegar com cadeiras de rodas. Em alguns casos, as trilhas são convencionais de graus de dificuldade fácil a moderado, com possibilidade de uso convencional ou com equipamentos adaptados.
Para maiores informações, sugerimos o blog Turismo Adaptado, do competente, cadeirante, Ricardo Shimosakai, pioneiro em acessibilidade, bacharel em turismo.
Docente do MBA de Gestão em Hotelaria de Luxo, MBA de Gestão de Eventos e Cerimoniais de Luxo e Pós-Graduacão de Arquitetura Hoteleira, Ricardo escreve para diversos meios de comunicação e ministra palestras por todo o mundo contando sua história de superação pessoal e empreendedorismo.
Acesse esse link para informações sobre Trilhas para Pessoas com Necessidades Especiais.
Acesse esse link para informações e fotos de trilha para cadeirantes e deficientes visuais (© Roberto M.F. Mourão, outubro 1999)
Defina a trilha conforme o caminhante ou ciclista ou observador de aves…
Do ponto de vista do caminhante para se criar uma trilha de acordo com a experiência que deseja fornecer, considere:
- O interesse de quem vai usar
- O nível de preparo e habilidade física dos usuários, p.ex., reduza o grau de dificuldade se desejar oferecer a trilha para uma ampla gama de usuários diferentes de idades e interesses
- A exposição ao risco de acidentes (lesões, fraturas, perda, etc.)
- A duração da experiência – tempo de caminhada em minutos, horas, dias. semanas ?
- Se a proposta for uma rota para um destino específico, escolha o caminho mais curto e mais simples
- Se a proposta for o destino em si, procure uma rota mais interessante e divertida.
Grau de Dificuldade da Trilha
A definição do grau de dificuldade de uma trilha é uma tarefa que pode ser complicada para definir, uma vez que depende de vários fatores:
- A experiência de quem usará “define” o grau de dificuldade
- Quem usará a trilha, uma vez que a trilha poderá ser considerada:
- fácil ou dificuldade moderada para um caminhante experiente e em boa forma física,
- ao passo que, pode ser o contrário: difícil e extenuante para um caminhante iniciante ou sedentário
- Em que estação a trilha será usada ?
- Nas chuvas ? na seca ? no ano inteiro ?
- Considerando que no Brasil usualmente temos duas “estações”: chuva e seca.
- Qual será o caminho que pode ser usado em qualquer hora, dia ou estação do ano ?
- A caminhada será feita com mochila ‘day-use‘ (ou “de ataque”), utilizada para caminhadas curtas, sem pernoite ?
- Ou a caminhada será uma travessia, com pernoite(s), com mochila ‘cargueira’ com equipamento para acampar ?
Importante frizar que graus de dificuldade podem variar para uma trilha se for guiada ou auto-guiada.
Exemplos de Classificação de Grau de Dificuldade
Como dissemos, classificar quanto à dificuldade uma trilha é bastante subjetivo pois o grau de dificuldade varia de pessoa para pessoa, dependendo basicamente do condicionamento físico e peso da eventual bagagem (mochila) carregada. Geralmente a classificação é elaborada utilizando-se combinações de letras (variando de A e E) e/ou números de (1 a 3), em geral um referindo-se ao nível técnico e outro à intensidade, não necessariamente nesta ordem.
Consideramos a tabela abaixo genérica e orientadora para que se possa classificar uma trilha.
Exemplos Internacionais de Classificação de Graus de Dificuldade
The Adventure Company
Graduação nas trilhas
- Fácil
- Moderada
- Extenuante
Classificação das atividades, graus:
- Grau A
Passeios que podem ser apreciados sem obrigatoriedade de ter que caminhar ou desenvolver alguma atividade física. Não requer experiência anterior. - Grau B
Requer alguma atividade física. Se for necessário pernoitar na trilha, é recomendado (mas não exigido) experiência de camping. Em geral não será necessário carregar uma mochila pesada, mas se este for o caso, adotar-se-á graduação B-3. - Grau C
Requer condicionamento físico, pois as trilhas podem ser longas, acidentadas e/ou cansativas. Em geral envolve pernoite na trilha. - Grau D
Requer bom condicionamento físico e experiência básica em montanhismo: camping, caminhadas em clima adversos, manuseio de equipamentos. Pode exigir o fator altitude (acima de 4.000m). - Grau E Expedição
A pessoa deve ser capaz de desenvolver intensa atividade física durante muitos dias em lugares de difícil acesso. É necessária experiência comprovada em montanhismo. Deve-se estar preparado para executar as mesmas tarefas dos guias: cozinhar, montar barracas, etc.
Observação: nas excursões de Grau C, D, e E, sempre que possível e necessário, serão utilizados animais ou carregadores para o transporte de equipamentos e mantimentos.
Mountain Travel Sobek
Quanto à intensidade
- Fácil
- Moderada
- Difícil
Quanto ao Nível Técnico
- Fácil, é necessário apenas boa saúde
- Requer atividade física como caminhada de 3 a 7 horas ao dia
- Caminhadas equivalentes a B só que acima de 4.500m, o que requer melhor condicionamento físico
- Grande condicionamento físico com experiência básica de montanhismo
- É necessário ao menos três anos de comprovada experiência no tipo de expedição.
Easy / Fácil
Muitas atividades são opcionais e envolvem viagens bastante fáceis. As viagens podem incluir caminhadas curtas de duas a três horas ou caminhadas opcionais em baixas altitudes. Pode incluir caiaque no mar menos exigente e rafting com corredeiras Classe I-II.
Moderate / Moderado
Viagens mais ativas envolvendo caminhadas em terrenos moderados, geralmente – mas nem sempre – com apoio de veículos e em altitudes inferiores a 3.000 metros (10.000 pés), ou viagens com longos dias de caminhada, vários dias de caiaque no mar, acampamento selvagem ou outras atividades revigorantes.
Em muitas viagens, você pode optar por ignorar a atividade de um dia, dependendo da logística. Pode incluir passeios de caiaque no mar mais exigentes e rafting em rio com corredeiras Classe III.
Strenuos / Extenuante
Caminhadas e trekking em terreno mais íngreme ou mais acidentado ou onde as elevações podem exceder 3.000 metros (10.000 pés), geralmente leva vários dias seguidos. Pode incluir viagens de caiaque mais exigentes (4-5 horas remando por dia) e rafting em rio com corredeiras da Classe IV-V.
Ultimate Challenge! / Desafio final!
Viagens mais exigentes: trekking em terreno íngreme e acidentado em altitudes elevadas (sem suporte de veículo) ou com ganhos substanciais de altitude e perdas; viagens ao remoto e extremo deserto; viagens de montanhismo. Pode incluir caiaque de mar mais exigente (5-7 horas remando por dia) e passeios de rafting em rio com corredeiras Classe IV-V.
Traçado
As trilhas, preferencialmente, devem ser desenvolvidas para uso público quer em áreas públicas ou privadas, a partir de picadas ou caminhos existentes.
Deve-se procurar que as trilhas se mesclem com o ambiente natural, mantendo continuidade e regularidade na forma como atravessa a paisagem. Na medida do possível, devem ser evitadas mudanças bruscas de direção, variantes em excesso ou curvas acentuadas, a menos que o traçado e a topografia do percurso exija.
Ao mesmo tempo, seções planas e longas devem ser usadas com moderação pois tornam o caminhar monótono, cansativo e com pouco interesse para os caminhantes.
Quanto ao traçado as trilhas podem ser classificadas de 5 diferentes formas:
- Trilha Circular
Trilhas que tem inicio e fim no mesmo ponto, mais seu traçado se assemelha a um circulo, onde os caminhantes fazem um único caminho sem repeti-lo.
A vantagem desse formato, é que não se passa mais de uma vez pelo mesmo local, e os grupos não se cruzam ao percorrer a trilha. Tem a capacidade de comportar mais grupos simultaneamente, desde que respeitando-se a capacidade de carga.
Trilhas circulares são excelentes para o uso em educação ambiental uma vez que, ao permitirem maior número de grupos, possibilitam escolas ou empresas de turismo pedagógico oferecerem passeios e aulas para mais alunos. Dividindo grupos com maior número de participantes em pequenos grupos, possibilta-se uma melhor experiência, menos algazarra e, consequentemente, melhor aprendizado e sensibilização.
- Trilha em Oito
A trilha em Oito, assim como a circular, tem seu inicio e fim também no mesmo ponto, o que as diferenciam é que a trilha em oito, cruza com um ponto intermediário no seu percurso.
Esse tipo de trilha é indicado a se utilizar em ambientes de espaço limitado, pois pode proporcionar uma maior interação dos visitantes com o ambiente, mesmo se tendo um espaço reduzido.
Além do seu formato cruzar com um ponto durante a trilha, em sua grande parte, os visitantes não repetem caminhos já feitos anteriormente, criando uma maior satisfação em sua visita. Uma extensão seria mais cruzamentos ou “oito duplo”, caso o espaço permita.
Click nesse link para ver exemplo de trilha projetada para o Forte do Morro, em Paraty.
- Linear de Ligação ou Trilha de Acesso
Esse tipo de trilha, normalmente é o mais utilizado, o seu percurso de ida é o mesmo de volta, normalmente tem a função apenas de ligar um ponto a um atrativo principal (cachoeira, praia, poço, mirante, aldeia ou vila de comunidade etc.).
Esse tipo de trilha tem a desvantagem de o caminho de ida ser o mesmo da volta, não causando assim um grande impacto nos visitantes, alem da possibilidade de estar sempre cruzando com outros grupos de visitantes, o que provoca alargamento da trilha, em geral é o modelo onde os impactos negativos são mais perceptíveis e visíveis.
É importante ressaltar que uma trilha de acesso pode vir a ser uma Limitante Crítica na definição da Capacidade de Carga ou de Suporte do atrativo principal como, p.ex., uma praia ou cachoeira. Melhor explicando, a praia, na ilustração ao lado, tem capacidade e 200 visitas/dia, enquanto que a trilha permite 50 visitas/dia, resultando que a capacidade da trilha “limita” a capacidade da praia.
Nesse caso, como utilizar a praia em sua plena capacidade ? Pode-se criar outro acesso, outra trilha, fazer melhorias na trilha existente de forma a aumentar sua capacidade, ou, ainda fazer acesso por outro meio como, p.ex., de barco. Muitas vezes gestores ou empresários, que tem negócios nessa praia (bares, restaurantes, aluguel de equipamentos náuticos etc.), podem desrespeitar esses limites e vira causar dano. Danos esse que podem não ser mitigados ou corrigidos, ou com custos altos para reverter a situação.
Um caso exemplar de reparos a altos custos aconteceu na Trilha Inca, no Peru, em que Machu Pichu, sítio de Patrimônio de Cultural e Natural da Humanidade, foi ameaçado pela Unesco de perder o título, por sobre-uso causando consequentes danos excessivos.
Veja o estudo de caso: Trilha Inca – Impactos Negativos, Recuperação Unesco.
- Trilha Linear de Travessia
A trilha tem seu inicio e fim em pontos distintos, normalmente esse tipo de trilhas, são conhecidas também como Trilhas de Travessias, que fazem a ligação entre dois pontos distintos que podem ser duas vilas, Como possuem inicio e fim em diferentes pontos, a incidência de se cruzar com outros grupos é pequena, mais ainda existe, quando grupos resolvem iniciar em pontos distintos, ou quando existe um grupo com menor preparo e acaba sendo alcançado.
Apesar de existir essa possibilidade de se cruzar com outros visitantes durante o trajeto, tem esse inconveniente minimizado devido a sua utilização, como normalmente são trilhas de travessias, podendo ocorrer a necessidade de pernoite em etapas intermediárias (aldeia ou vila, acampamento “selvagem” etc.), o encontro com outros grupos em determinados momentos pode ser prazeroso aos caminhantes, criando uma atmosfera de bate-papo e troca de experiências.
Caminho Cora Coralina
Um excelente exemplo de trilha de travessia é o Caminho Cora Coralina, em Goiás.
Com 300 km de extensão, passando por 8 cidades goianas – Corumbá de Goiás, Cocalzinho de Goiás, Pirenópolis, São Francisco de Goiás, Jaraguá, Itaguari, Itaberaí e Cidade de Goiás, que sai de Corumbá de Goiás e termina na Cidade de Goiás, podendo ser feita caminhando ou de bicicleta. Modal: caminhada, bicicleta; bioma: Cerrado; estruturação: dividido em 13 trechos; com 40 pontos de apoio, atravessando 3 unidades de conservação.
- Trilhas Mistas
As Trilhas Mistas, em seu próprio nome já diz, são aquelas trilhas que possuem em seu traçado mais de um dos tipos descritos anteriormente. Alguns parques nacionais possum um sistema de trilhas que oferece muitas variantes, com diferentes graus de dificuldade e de interesses (contemplação, relaxamento, observação da flora ou aves, montanhismo, escalada etc.).
Exemplos de mapas de traçados de trilhas
- Parque Nacional da Tijuca, Rio de Janeiro, RJ
- Parque Nacional da Serra dos Órgãos, Sede Guapimirim, RJ
- Living River, Cahaba, Alabama, USA
- Beaver Creek Reserve, USA
- Land Sand Trails Berry’s Mountain, USA
Conceitos
- Trilhas – Índice Geral
- Trilhas – Desenho, Usos, Grau de Dificuldade, Traçado
- Trilhas – Uso Recreativo
- Trilhas – Interpretação
- Trilhas – Exemplos de Interpretação Ambiental
- Trilhas – Estudo e Pesquisa: Estación Biológica La Selva, Costa Rica, (Estudo de Caso, 2005)
- Trilhas – Caminhos do Peabiru (Estudo de Caso, 20o6)
- Trilhas – Trilha Inca / Camino Inka / Inka Trail – Impactos, Recuperação (Estudo de Caso, 2003/2008)
- Capacidade de Carga Turística CCT – Trilhas
- Miguel Cifuentes Arias, una vida dedicada a la Naturaleza
- Capacidade de Carga Turística da Trilha Macuco Safari, Parque Nacional do Iguaçu
- Torres e Passarelas de Copada / Canopy Towers & Walkways
- Projeto Trilhas e Mirantes do Forte do Morro, Paraty
Trilhas de Longo Percurso
- Caminhos de Santiago de Compostela (Estudo de Caso, 2015)
- Trilha dos Apalaches / Appalachian Trail
- Trilha Transcarioca
- África, de caminhão de Londres – Dar-es-Salaam, 1985-86
- Wooly’s Off Road Club, USA (Estudo de Caso)
Roberto M.F. Mourão / ALBATROZ Planejamento
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