Ecoturismo Pataxó
Reserva da Jaqueira
Terra Indígena Pataxó de Coroa Vermelha, Bahia

Autoria: Roberto M.F. Mourão, ALBATROZ Planejamento

 
Histórico

Entre setembro e dezembro de 1997 foi criado o Manual Indígena de Ecoturismo, produto do Programa-piloto de Ecoturismo em Terras Indígenas, uma demanda “emergencial” da Secretaria da Amazônia Legal, do MMA.

Esse manual foi distribuído a diversas associações e comunidades para servir de subsídios para que estas pudessem desenvolver atividades ecoturísticas em suas terras, atividade proibida na época pois ainda não havia sido desenvolvida e monitorado seus eventuais impactos sociais.

Um desses manuais foi presenteado ao eng. florestal Anders Tosterud, na época gerente ambiental da Companhia Veracel de Papel e Celulose, na Bahia, onde o consultor Roberto M.F. Mourão havia desenvolvido um trabalho embrionário que resultou, posteriormente, na implementação da RPPN Estação Veracel.

Que por sua vez, presenteou uma cópia, em preto e branco, a Nytinawã Pataxó, da Reserva da Jaqueira, um fragmento preservado na Terra indígena de Coroa Vermelha, em Porto Seguro, Bahia.

Nytinawã (na foto), irmã do cacique, que na época não se interessou pelo assunto, junto com jovens pataxó, começou a ler e discutir o manual, com a intenção de por em prática o ecoturismo e transformá-lo numa fonte de renda para sua comunidade. 

O resultado foi além do esperado pois, a partir daí, foi iniciado um processo de recuperação cultural onde o idioma, danças e rituais foram resgatados que, não só viraram um “atrativo cultural” mas, sobretudo, um resgate cultural.

Reserva da Jaqueira

A história da Reserva da Jaqueira começou em 1997, quando Coroa Vermelha foi demarcada e homologada como Terra Indígena.

A Constituição trata de forma destacada este tema, apresentando, em seu artigo 231, o conceito de terras tradicionalmente ocupadas pelos índios, definidas como sendo: “são aquelas por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições”.

Terras que “são bens da União” e que são “inalienáveis e indisponíveis e os direitos sobre elas imprescritíveis”.

Embora os índios detenham a posse permanente e o “usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos” existentes em suas terras, elas constituem patrimônio da União. E, como bens públicos de uso especial, as terras indígenas, além de inalienáveis e indisponíveis, não podem ser objeto de utilização de qualquer espécie por outros que não os próprios índios.

Essa terra se divide em duas glebas separadas:

  • Gleba A – é urbana e fica na beira do mar.
  • Gleba B – são roças e florestas e fica em cima do tabuleiro.

No mesmo ano de 1997, os índios ficaram sabendo que uma empresa iria lotear e retirar os recursos naturais de parte de Gleba B, ou seja, iria retirar as árvores, plantas e animais que ali existem.

Esta área pertence aos Pataxó e tem 827 hectares de Mata Atlântica, a floresta tropical mais ameaçada do planeta. Com ajuda de outras aldeias a área foi retomada de forma pacífica, garantindo o futuro de seus descendentes.

Em agosto de 1998, um grupo de 30 índios, entre jovens e adultos, saíram de Coroa Vermelha para fazer um passeio na mata. Lá vivenciaram como os seus antepassados viveram no seu verdadeiro lugar e perceberam a importância da floresta para fortalecer o espírito e a cultura. Quando retornaram, se reuniram, conversaram e perceberam que todos tínhamos o mesmo objetivo: vivenciar e demonstrar a beleza da nossa cultura e preservar o meio ambiente.

Com grandes dificuldades percorriam a pé 12 km todos os dias, enfrentando a falta de recursos para construir os kijemes (casas tradicionais), sem nenhuma ajuda externa, enfrentando chuva, lama e morros para coletar os materiais de construção necessários. Foram construídos 8 kijemes, um maior onde funciona o Centro de Reunião e sete, menores, para a vivência culturais.

Hoje, a Reserva da Jaqueira está aberta para a visitação de turistas, estudantes e pesquisadores com acompanhamento de guias Pataxó da Aspectur, associação indígena fundada para essa atividade. Durante a visitação, que inclui palestras e passeio por uma trilha na mata, apresentação do conhecimento tradicional da flora e da fauna, danças, degustação da culinária tradicional e de bebidas não-alcoólicas, entre outras atividades. Um programa de

replantio de mudas nativas da Mata Atlântica, entre elas espécies raras e ameaçadas de extinção como o pau-brasil e o jacarandá, supridas por um viveiro com mais de 5 mil mudas.

Projeto de Etnoturismo

O Projeto da Jaqueira, da Associação Pataxó de Ecoturismo – Aspectur, instituição comunitária sem fins lucrativos, que tem por objetivo principal a implantação de atividades de ecoturismo e educação ambiental na Reserva da Jaqueira, fragmento preservado de Mata Atlântica na Terra Indígena Pataxó de Coroa Vermelha, em Porto Seguro, Bahia.

Ele visa fornecer os meios necessários para a geração de renda para a comunidade indígena e para a conservação da mata, parte em estado primário, componente de corredor ecológico com a Estação Vera Cruz, da Embrapa.

O projeto nasceu a partir da iniciativa própria da comunidade indígena e já se encontra implementado com as seguintes ações:

  • formação de guias-condutores indígenas;
  • demarcação e sinalização de trilhas;
  • construção de ponte suspensa e mirantes, para o observação das paisagens naturais e conhecimento da sua biodiversidade;
  • instalação de um viveiro para produção de mudas nativas: alimentícias, medicinais ou usadas no artesanato e reflorestamento, para uso próprio da comunidade e para a comercialização, servindo, inclusive, de espaço para visitação e atividades educativas;
  • centro de reunião e demais kijemes (casas indígenas) já construídos, demonstram a beleza e praticidade da arquitetura tradicional pataxó – essa infra-estrutura será incrementada para aumentar a capacidade de visitação e permitir o pernoite de um número limitado de visitantes na mata;
  • o centro pataxó de saúde, construído pelo ministério da cultura, na parte urbana da terra indígena, servirá de ponto de comercialização e distribuição de remédios tradicionais para a comunidade, com objetivo de suprir, em parte, suas enormes carências na área de saúde.

O conjunto dessas ações permitirá a sustentação do projeto e a realização de trabalhos educativos e sociais junto à comunidade, além da geração sustentável de renda para os membros da Associação.

Resultados
  • preservação e recuperação da Mata Atlântica na Jaqueira, no seu entorno e no corredor com a Estação Vera Cruz.
  • geração e desenvolvimento de alternativas sustentáveis de emprego e renda para a população indígena Pataxó de Coroa Vermelha.
  • fortalecimento institucional, gerencial e administrativo dos Índios Pataxó, com potencial multiplicador nas outras aldeias.
  • afirmação e fortalecimento da identidade cultural e domínio territorial da comunidade indígena Pataxó de Coroa Vermelha.
  • educação e conscientização ambiental das crianças e jovens indígenas e não indígenas da região, assim como dos turistas.
  • criação de referência regional e nacional que sirva como exemplo e modelo de desenvolvimento sustentável para comunidades indígenas.
Visitação

Horário de visitação: das 09:00 às 17:00 horas, de segunda a sábado.

Atividades: (visitação com duração aproximada de 3 horas)

  • recepção por guias-indígenas vestidos com roupas tradicionais,
  • palestra (± 20 minutos),
  • caminhada de 1.160 m nas trilhas, com armadilhas, plantas medicinais etc
  • ritual demonstrativo pelos Índios,
  • degustação de pratos típicos – peixe feito na folha da patioba e bebida típica não alcoólica de mandioca de nome cauim,
  • aquisição opcional de artesanato.

Contatos: Instituto Pataxó de Etnoturismo.

Whatsapp: (73) 99800-2236
E-mail: aspectur@reservapataxo@gmail.com  

A Reserva Pataxó da Jaqueira está localizada ao sul do Estado da Bahia, a 720 Km da capital Salvador (BR 101), a 15 Km ao sul da cidade de Porto Seguro e a 8 Km ao norte da cidade de Santa Cruz Cabrália (BR 367).

Coroa Vermelha

Quando se chega a Santa Cruz Cabrália é inevitável pensar na primeira missa celebrada no Brasil. A Coroa Vermelha, local da celebração e marco do descobrimento, está à direita, bem próxima da chegada à cidade.

O local corresponde à atual área da Terra Indígena da Tribo Pataxó da Coroa Vermelha e é um dos ícones mais significativos da Costa do Descobrimento.

Cabrália é um centro turístico com infra-estrutura moderna que se desenvolveu rapidamente. Dispõe de bons hotéis e pousadas, restaurantes, camping, agências de turismo que fazem passeios de escuna e agências bancárias.

A cidade fica entre o Rio João de Tiba e um quebra-mar natural na Baía de Cabrália. Na área da atual cidade, existiu inicialmente o povoado de Santa Cruz, fundado pelo donatário Pero do Campo Tourinho, e que foi destruído pelos índios Aimorés, em 1564.

O povoamento atual do município começou na Cidade Alta, que oferece uma visão panorâmica da região. Ao sopé do morro, a cidade de Santa Cruz Cabrália; à direita, a Coroa Vermelha; à esquerda, o início da APA Santo Antônio, a foz do rio João de Tiba com suas ilhas recobertas pelo manguezal, o quebra-mar natural de recifes – separando a água doce da salgada – e, ao longe, a Coroa Alta, um imenso recife com banco de areia em alto mar.

Santa Cruz Cabrália tem várias praias praticamente desertas, rios navegáveis, ideais para esportes náuticos e passeios, e vilas de aspecto bucólico, contrastando com a paisagem marinha.

Aberta à visitação, a Reserva da Jaqueira oferece uma oportunidade rara para o exercício prático da educação ambiental, além de permitir uma total integração com a comunidade Pataxó e seus costumes. As visitas são feitas em pequenos grupos e acompanhadas por guias e instrutores que explicam detalhadamente as características da região e do povo que a habita.

Nação Pataxó

No Brasil existem aproximadamente 215 povos indígenas e mais de 180 línguas faladas. A partir daí, se pode notar a diversidade de culturas e costumes existentes no país.

Os Pataxó são índios da família macro-jê e fazem parte do grupo dos botocudos – também chamados de aimorés ou tapuias. Quando chegaram os primeiros europeus, os botocudos ocupavam grandes faixas da mata atlântica, da baía de Todos os Santos até a foz do rio Doce, no Espírito Santo.

Na época da chegada dos portugueses ao Brasil (1500), as etnias Pataxó, Botocudo e Maxacali eram conhecidos como “Aimorés”. A primeira o nome de “Pataxó”, foi feita em 1850 pelo viajante austríaco Maximiliano Wied Neuwied, perto do Monte Arará, atual Monte Pascoal, situado no sul do Estado da Bahia.

Em 1861, por decisão do governo, os Pataxó foram deportados e aldeados à força em Bom Jardim, atual Reserva Barra Velha que fica perto do Monte Pascoal, e aí permaneceram esquecidos por quase 100 anos.

Em 1943, o governo da Bahia criou o Parque Monumento Nacional do Monte Pascoal.

Em 1951 ocorreu um grande massacre na aldeia de Barra Velha, causado por policiais militares da Bahia. Deste então, a maioria do povo Pataxó escondeu sua identidade indígena por medo ou para evitar discriminação.

Em 1961, o Estado da Bahia repassou o território do parque para a União, que criou por decreto o Parque Nacional do Monte Pascoal. A implantação do Parque obrigou os Pataxó, mais um vez, a retirar-se de suas terras e abandonar suas roças. As aldeias de Coroa Vermelha, Mata Medonha, Águas Belas e outras surgiram à medida em que, com passar dos anos, os Pataxó, dispersos, se juntaram nessas regiões.

Em maio de 1997 foi demarcada a terra de Coroa Vermelha, que passou então a ser chamada de Terra Indígena Pataxó de Coroa Vermelha. A partir daí, eles se organizaram para recuperar a identidade cultural.

Cultura

Dança

A dança tradicional pataxó é o AUÊ, onde chamam os espíritos dos antepassados e pedem o conforto de Tupã e a força da Mãe Terra. Os visitantes também podem participar como meio de confraternização dos povos, no qual transmitem energias para fortalecer os espíritos dos visitantes.

Jogo de Arco e Flecha

O arco e flecha é uma arma tradicional que no passado era usado para caçar e também guerrear. Hoje, o visitante na Reserva da Jaqueira pode aprender e se divertir com o arco e flecha.

Religião

O Pajé fica em seu kijeme preparando os remédios naturais, pedindo e trazendo conforto para seu povo. O Pajé é a pessoa que tem o contato com os antepassados e os mesmos podem fazer revelações e prevenir o Pajé de perigos futuros para sua comunidade.

Moradia

Os antigos Pataxó viviam em kijemes – casas arredondadas com telhado de palha. Na Jaqueira já existem várias. O principal kijeme é onde acontece a recepção do visitante, as danças tradicionais, reuniões e palestras. Existem mais 8 kijemes menores, cada qual tendo a sua função: a cozinha com fogão de barro, o kijeme do Pajé (onde é feito o trabalho com ervas medicinais e orações) e os kijemes de apresentação das comidas e bebidas tradicionais.

Comidas e Bebidas Tradicionais

O visitante pode experimentar o mukussuy, isto é, um peixe assado na folha da patioba, espécie de palmeira. O acompanhamento é a kuyúna de puba, farinha tradicional indígena, um pouco mais grossa que a comum e para completar tem o kauím, vinho da mandioca.

Artesanato

Como é de costume, o índio faz o seu artesanato e suas vestes. Na Reserva da Jaqueira os visitantes poderão encontrar esculturas de barro, gamelas, conjunto de arco e flecha, tupyssay (vestimenta típica), massacás (colares), entre outras lembranças.

 

 



Na mídia: Reserva da Jaqueira tem como foco a revitalização da Cultura Pataxó, Globo Ecologia, 2011
Nota: pela implementação do projeto de ecoturismo, Nytinawã foi eleita cacique.

Imagem “O que é ser índio pra você” © Arissana Pataxó: Portfólio Instagram

 

Roberto M.F. Mourão / ALBATROZ Planejamento
Para uso e permissões favor contatar: roberto@albatroz.eco.br

 

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