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Cipozeiros 

Autoria: Roberto M.F. Mourão, ALBATROZ Planejamento

 

Cipozeiros

Cipozeiros constituem comunidades tradicionais que vivem da extração e do artesanato de diferentes espécies de cipós e de outras atividades de subsistência.

O Cipozeiro é aquele que vive mesmo é do cipó.

Projeto Cipó Imbé

Na região de Garuva, Estado de Santa Catarina, cerca de 200 famílias se dedicam direta ou indiretamente ao artesanato com fibras vegetais.

A principal fibra nativa é o cipó imbé (Philodendron corcovadense), tradicionalmente utilizado há gerações, sendo suas raízes usadas para artesanato de cestas e balaios diversos, chapéus, luminárias, entre outros artigos decorativos e utilitários.

Os Cipozeiros de Garuva são descendentes de colonizadores de origem européia (alemães, poloneses, italianos e portugueses), e vivem em pequenas propriedades na área rural.

Podem complementar a renda com a pesca, com a extração de outros produtos florestais (como “palha”, “taboa”, “peri”), com as roças de aipim e com trabalho assalariado temporário ou artesanato com vime. Em muitos casos dependem unicamente da renda do trabalho com cipó.

O Trabalho com o Cipó

O trabalho com cipó imbé envolve vários membros da família: homens e mulheres, jovens e adultos, crianças e idosos.

As raízes são retiradas da “mãezera” por corte com faca, ou por torção do fio (“coxado”).

“…não pode cortar a mãezera, senão acaba o cipó”.

São retiradas apenas raízes maduras, deixando outras mais jovens, “pra não deixar a mãezera sem água”.

A escolha da área para nova retirada segue aproximadamente um esquema de “pousio”.

Depois o cipó é descascado, raspado, seco, partido, perfilado e então trançado.

A produção, que vai para outros lugares do Estado e também Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Mato Grosso, é vendida para intermediários por um preço baixo, gerando necessidade de produção intensa (até 15 horas/dia de trabalho) e, infelizmente, queda de qualidade dos produtos, e intensificação na busca do recurso na floresta.

Modo de Vida

O modo de vida dos cipozeiros está intimamente relacionado com o mundo natural, em especial com a Mata Atlântica.

Vivem em grupos familiares e de afinidade que compartilham a atividade extrativista e de artesanato do cipó.

A extração do cipó e o artesanato são atividades que ocupam um lugar central em seu modo de vida, conformando o eixo a partir do qual se organiza o tempo e o conjunto de sua atividade econômica.

São exercidas e lideradas principalmente por mulheres, ainda que muitos homens também participem de todas as etapas produtivas.

A maior parte de sua subsistência é baseada em atividades extrativistas, realizadas por meio do manejo sustentável, sem comprometer a dinâmica dos sistemas regenerativos da Mata Atlântica, bioma ao qual estão adaptados há muitas décadas.

Críticos da destruição da natureza, fazem um uso conservacionista dos recursos. Desde a extração dos cipós, ou até mesmo na prática da caça, observam os ciclos naturais, evitando práticas predatórias dos recursos e procurando garantir a regeneração dos recursos – sem os quais não poderiam reproduzir seu modo de vida.

O avanço da urbanização, a construção de rodovias, o desmatamento e a especulação imobiliária vêm representando uma crescente ameaça aos territórios tradicionais dos cipozeiros.

Em Santa Catarina e no Paraná, os Cipozeiros procuram resistir a esses avanços, organizando-se para garantir o acesso ao território e o reconhecimento de seu modo de vida.

Dessa forma, inscrevem-se, de forma peculiar, na mesma problemática de outros povos e comunidades tradicionais constantemente ameaçados pela expansão da territorialidade hegemônica do capitalismo globalizado.

Para elas, o território possui uma importância vital, sendo a partir dele que se produz e reproduz sua vida material e simbólico.

Processo Produtivo

Quanto ao processo produtivo com o cipó, de maneira resumida, este se dá da seguinte maneira:

  • Inicia-se com o deslocamento até a mata, onde se faz a extração do cipó.
    Este deve estar maduro e, além disso, não se pode tirar todos os cipós de uma árvore para não colocar em risco a “mãezera” (a “planta mãe” que dá o cipó). Os cipozeiros afirmam que antigamente era fácil acessar os locais de extração. Atualmente, lidam com vários obstáculos, como a distância (até duas horas de caminhada pela mata), redução da matéria-prima (efeito do desmatamento), dificuldade para acessar as propriedades (que são privadas);
  • Depois da extração, há que se carregar o cipó bruto para fora da mata.
    Os cipós são organizados em feixes que podem chegar a pesar até 60 kg. Em média, pesam entre 10 e 20 kg. Esse trabalho é realizado por homens e mulheres;
  • O cipó é então armazenado em local próprio, em casa.
    Pode ser utilizado bruto ou beneficiado, o chamado “cipó branco”. Para o beneficiamento, o cipó deve ser descascado, uma tarefa árdua, que exige destreza e resistência física. Em seguida, são deixados num telhado ou outra superfície para escorrer o líquido interno e secar;
  • Já seco, os cipós brancos são manipulados em um “gabarito” para se chegar à espessura adequada.
    Esse gabarito é uma caixa elaborada artesanalmente pelos cipozeiros. Esse procedimento é denominado de “passar o cipó”;
  • Após esses processos, as peças de artesanato, de cipó bruto ou branco, são elaboradas e posteriormente são vendidas na beira de estrada, a atravessadores ou em feiras.

Entre os cipozeiros, mais do que uma diferenciação, existe uma oposição entre aqueles que se consideram “cipozeiros tradicionais” e os chamados de “cipozeiros da cidade”, alguns vistos como oportunistas.

Os tradicionais são aqueles que, há várias gerações, demonstram preocupação com o meio ambiente. Já os oportunistas são aqueles que somente extraem o cipó para venda e não fazem o manejo considerado correto pelos cipozeiros tradicionais, isto é, de modo que permita a regeneração do recurso.

 

 


 



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